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Professora homenageia alunos em crônica

por Comunicação Campus Macaé publicado 28/07/2020 14h33, última modificação 28/07/2020 14h33
Texto da docente Alice Pereira reflete a saudade da sala de aula.
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Alice Pereira, professora de Inglês do Campus Macaé.

A professora de Língua Inglesa do Campus Macaé, Alice Pereira, movida pela saudade gerada no período de isolamento social, escreveu uma crônica onde descreve os pequenos momentos de seu cotidiano como professora e o quanto sente falta deles. O texto foi publicado em seu blog pessoal, criado em abril deste ano para relatar suas experiências de quarentena.

Segundo ela, a inspiração veio da angústia que os docentes sentem da falta de interação  com os alunos, das vivências em sala de aula e do cotidiano da escola. “Também foi um modo mais informal e afetuoso de comunicar pros alunos esses sentimentos e de me conectar com outros docentes”, explica.

Alice é professora do campus desde 2014 e é doutoranda em Estudos Literários pela Universidade Federal Fluminense. Atua como colaboradora do Núcleo de Gênero, Diversidade e Sexualidade do IFFluminense, Campus Macaé (Nugedis), onde escreve poemas para publicação no perfil do projeto no Instagram.

Segue a íntegra da crônica:

"É pra copiar?

Já faz quatro meses que não escuto um dos meus jovens alunos/as perguntar: “É pra copiar?”, quando durante uma aula, tem matéria escrita no quadro. Ou aquela já famosa e detestada interrogação, “vale ponto?” ou ainda a indagação, “vai dar visto nesse exercício?”. Também tem a dúvida “pode ser em trio?”, quando instrui os alunos a formarem duplas. Às vezes, um aluno/a me pergunta: “E aí, professora, já fez chamada?”, mesmo eu sempre fazendo no final da aula. Faz tempo que não escuto um “poxa, professora, libera a gente mais cedo!”. Vinte semanas que não ouço ninguém reclamar que fez o trabalho, mas tá sem nota no sistema, nem protestar contra trabalhos em grupo, argumentando que preferia fazer sozinho. Essas pequenas interações que temos com os estudantes, tem feito muita falta no meu cotidiano. E falo isso plenamente consciente que reclamo de tudo isso. Não raro, respondo essas perguntas com impaciência. Desculpem por isso.
Meses que não repito várias vezes a mesma explicação; que não planejo jogar Bingo que não tem nada a ver com números, só pra praticar um vocabulário novo; que não marco uma aula no laboratório de informática pra poder ver vídeos no YouTube; que não escrevo a data no quadro; que não rio com respostas inusitadas pra perguntas que achei que eram óbvias; que não entro na sala errada porque dou aula em tantas salas diferentes, para tantas turmas diferentes; que não peço ajuda pra montar o projetor; que não chamo de Matheus alguém que se chama Gabriel porque afinal eu tenho uns 10 alunos com esses nomes; que olho pra Mariana e penso que ela se parece muito com a Carine, da 2001a, será que são irmãs?
Quatro meses que a gente não abraça aqueles ex-alunos queridos quando nos encontramos no refeitório, na quadra, nos corredores. E tem sempre uns que a gente vê, nos dão um sorriso, e soltam um: “E aí, professora?”, e nem sempre a gente recorda quando aquela pessoa esteve sentada nas carteiras das nossas salas. De que turma ele era mesmo? Caramba, eu vi esse menino tímido e baixinho, agora já tá se formando! Eu vi essa garota introvertida e quieta virar representante de turma, artista, ativista, Quanto mais tempo na mesma escola, mais a gente fala essas coisas, afirmamos nossa surpresa diante da constatação que o tempo passa, que os alunos e alunas crescem, florescem, vão embora.
Sei que etimologicamente a palavra aluno poderia ser traduzida como “sem luz” e que nós, professores, os supostos detentores do conhecimento deveríamos acender um fósforo, fazer a fogueira e iluminar seus caminhos. A ironia é que na verdade são eles que iluminam nossos dias, são os que nos instigam, motivam e confrontam. Suas críticas muitas vezes são sacudidas necessárias, que nos fazem perceber e retificar nossos equívocos. Sua admiração nos faz querer ser educadores cada vez melhores e muitas vezes nos resgatam das garras da dúvida sobre nossa própria competência. Não tem interação a distância, qualquer que seja a ferramenta, aplicativo ou plataforma, que seja o bastante para suprir essas ausências porque sem eles, nós estamos na escuridão, girassóis na noite sem fim."