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Minoria da classe média brasileira tem poder de estimular regresso autoritário, diz pesquisador
A palestra reuniu estudantes e professores do IFF Campos Centro e de outras instituições.Fotos: Raphaella Cordeiro
Embora a democracia seja aceita por ampla maioria dos brasileiros, o apoio ao sistema de governo que se sustenta no voto pode não ser suficiente para assegurá-lo. Para o professor e pesquisador do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) Adalberto Moreira Cardoso, uma minoria da classe média no Brasil teria poder suficiente para estimular o retorno a um regime não democrático, como aconteceu em 1964, quando se instaurou o regime militar.
A convite do Núcleo de Estudos Políticos (NEP), do Campus Campos Centro, do Instituto Federal Fluminense (IFF), Adalberto Cardoso apresentou, nesta terça-feira, 5 de novembro, no auditório Cristina Bastos, a palestra “Classe médias e política no Brasil: 1922-2018" que é fruto do livro que será lançado pela editora da Fundação Getúlio Vargas.
“Primeiro é preciso não homogeneizar. As classes médias são muitas. Tem uma parte das classes médias que quis os militares de volta, redução da maioridade penal e tem todo um conjunto de pautas anticivilizatórias, de gênero, das diferenças em geral, das minorias quilombolas, índios… Tem toda uma pauta conservadora e anticivilizatória que é apoiada por parcelas das classes médias que poderia, por exemplo, resultar em algo deste tipo, apoio a um regresso autoritário”, afirmou.
Para 69% dos brasileiros, a democracia é a melhor forma de governo, segundo pesquisa do DataFolha divulgada em 4 de outubro de 2018. Ao mesmo tempo, outro levantamento feito no mesmo ano pelo Pew Reserarch Center apontou que 83% da população estão insatisfeitos com o sistema.
Além do Brasil, o professor comentou sobre os protestos no Chile que já ocasionaram 23 mortes.
Portal IFF - Há um temor de que as manifestações que ocorrem no Chile cheguem ao Brasil. Como o senhor analisa isso?
Adalberto Cardoso - Eu distinguiria o Chile de hoje do Brasil. Porque o Chile está reagindo contra políticas neoliberais que estão sendo implementadas há 40 anos. Na verdade, se você pensar que a democracia voltou ao país em 1990, você tem 29 anos de democracia e arrocho neoliberal com privatizações da saúde, da educação, a previdência no Chile é um descalabro. É um processo de privatização da vida coletiva no Chile muito mais intenso do que o Brasil viveu. No Brasil, diferente do Chile, existia um processo de ampliação dos gastos públicos em saúde, educação, em transporte urbano, infraestrutura, os PAC (Programas de Aceleração do Crescimento), Minha Casa, Minha Vida, programas típicos de um Estado de Bem-Estar, ao contrário do Chile.
Hoje as classes médias brasileiras flertam com regimes não democráticos?
Uma parte sim.
"Tem toda uma pauta conservadora e anticivilizatória que é apoiada por parcelas das classes médias que poderia, por exemplo, resultar em algo deste tipo, apoio a um regresso autoritário"
Tem espaço para virar um movimento contra a democracia?
Tem espaço sim. Tem espaço para tudo hoje no Brasil. Primeiro é preciso não homogeneizar. As classes médias são muitas. Tem uma parte das classes médias que quis os militares de volta, redução da maioridade penal e tem todo um conjunto de pautas anticivilizatórias, de gênero, das diferenças em geral, das minorias quilombolas, índios… Tem toda uma pauta conservadora e anticivilizatória que é apoiada por parcelas das classes médias que poderia, por exemplo, resultar em algo deste tipo, apoio a um regresso autoritário. Tem massa crítica no Brasil para isso em parcelas das classes médias. Mas eu não diria que essas parcelas são majoritárias. O problema é que elas podem ser minoritárias e conseguir uma coalizão suficiente para apoiar um regresso sem que isso tenha oposição relevante das parcelas majoritárias que são democratas. A ditadura em 64 foi resultado de movimento minoritário das classes médias com uma parcela não minoritária dos militares contra a maioria.
Essa minoria da classe média poderia contaminar uma sociedade?
Não contaminar a sociedade inteira. A sociedade pode ser contra. Mas pode não se mexer como aconteceu em 64. O povo não vai para rua. O povo fica olhando para ver o que sobra para ele. Normalmente, sobra mal. A população é quem paga o pato das crises econômicas, da violência policial, do desemprego e da miséria. E não vai para rua.